Manuella Dantas
Manuella Dantas narra nostalgicamente sua jornada na escola Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Ela destaca a mudança de uniforme, a rotina diária, as atividades recreativas e a interação com professores e alunos. A escola, repleta de memórias felizes e fundamentais para sua formação acadêmica, é retratada como uma parte importante de sua vida.
Estudei na Escola Estadual Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, em Coari, da 5ª série ao 3º ano do Magistério. Após concluir o ensino primário, na Escola Francisco Lopes Braga, fui para o Colégio, como chamávamos o Perpétuo Socorro. Lembro de sentir uma tremenda euforia quando fui estudar lá. Em primeiro lugar por minha mãe não dar aula no horário em que eu estudava, o que era para mim uma certa liberdade; em segundo lugar por ser uma escola grande – tinha 1º andar, segundo andar, porão, escadas, muitas janelas e portas – uma infinidade de lugares para explorar; e, em terceiro, e não menos importante, por não ter que usar mais aquela saia cheia de pregas que tínhamos como farda no Lopes Braga. Usar calça comprida era um sonho de liberdade para brincar de barra-bandeira na hora do recreio e correr no campo da igreja.
A farda realmente é um capítulo à parte. Uma blusa branca de botões na frente (o melhor era quando tinha botões de pressão), com um bolso estampando o símbolo da escola que deveria ser costurado do lado esquerdo do peito. Uma calça azul jeans ou de tergal e tênis, de preferência, branco. Tudo isso parece muito simples hoje, mas para época, nem tanto. O bolso que deveríamos estampar na farda era entregue aos alunos pela própria escola no início do ano. Nem sempre as lojas da cidade tinham tecido suficiente para atender a demanda e, no meu caso, era difícil encontrar uma calça jeans que coubesse em mim. Normalmente eu só tinha uma calça e com várias costuras na cintura. O tênis mais comum da época era um estilo conga. Mas o que gente mais gostava era um branco que tinha um solado verde. Não lembro agora como costumávamos chamar esse tipo de calçado. Alguém lembra?!
O horário de entrada no colégio era 7h30min. Fazíamos fila por turmas e a entrada era em ordem crescente das séries. Ficar na fila era sempre uma diversão. Uma conversa sem fim. Se houvesse alguma bagunça na hora da entrada, a fila voltava e ficava por último. O que nem sempre era uma coisa ruim, pois, podíamos estender um pouco mais o papo.
Nos primeiros anos que estudei lá a escola estava bem deteriorada. Paredes riscadas, portas quebradas, carteiras destruídas. Entrar logo na sala podia fazer uma grande diferença na hora de pegar uma carteira inteira. Acho que a primeira sala que estudei foi uma que dava para a área de práticas agrícolas. (Sim!! Eu ainda sou do tempo da aula de práticas agrícolas!! rsrs). Assim que batia a campa, nós entrávamos e caminhávamos um atrás do outro pelo corredor com o chão coberto por azulejos vermelho e amarelo. Depois a escola passou por uma reforma. Ficou linda! Nós tínhamos todo um esquema para zelar pela manutenção das salas e carteiras. Lembro que uma vez tivemos que passar um sábado limpando as paredes que começaram a ser riscadas novamente.
Na hora do recreio todos iam para a rua. Era um festival de guloseimas: picolé de taperebá, tapioca, açaí; totó de coco, cupuaçu com caroço; pirulito – daquele que vinha na tábua; paçoca, banana frita no saco acomodado nas bacias de alumínio, pão com arroz. Quem lembra do pão com arroz?? Às vezes eu descia para lanchar no seu Bebé. Dividia uma Fanta Laranja com a Elaine e saboreava o melhor salgado de queijo e melhor queijadinha que já comi na vida. Depois subíamos a rampa da igreja, normalmente correndo.
A quadra era uma extensão do colégio. Perdi as contas de quantas vezes eu subi e desci aquelas arquibancadas fazendo as aulas de educação física do professor Mariano; das vezes que gritei na torcida pelos times de handball; das vezes que dancei quadrilha nas festas juninas.
Quando cheguei aos últimos anos de magistério a turma já não era tão grande. Muitos colegas precisaram trabalhar e por isso mudaram de turno. Fomos estudar nas salas que ficavam próximas ao gramado. Ali podíamos sentir o vento que vinha do rio, acompanhar o movimento da Independência e trocar segredos na escada. No gramado havia também um pequeno palco onde fazíamos apresentações. Ali dancei coreografias da Xuxa, interpretei personagens da Escolinha do Professor Raimundo e da Praça é nossa.
O Colégio foi a base da minha vida acadêmica. Lá vivi uma infância e juventude saudável e alegre. Passeava por aqueles corredores como se fosse a minha casa. E era.
– Bom dia, professor Waldeci!
– Corre, que lá vem o Bego!
– Allan, você fez o mapa que a professora Creuza pediu?!
– Hoje não vai ter aula de religião com a professora Nícia!
– Raífran, a professora Ednéia veio hoje?
– O professor Feliciano pediu para alguém pegar giz na secretaria!
– Cadê o Valtemir? Foi expulso da aula de novo?
– Charles, qual foi sua nota com o Bêda?
– Neiva, você pode me emprestar uma caneta colorida?!
– Alguém aí conseguiu entender os textos de filosofia do Barbosa?
– Elma, que lindo seus álbuns de didática da professora Delvanir!
– Ah, por falar na professora Delvanir hoje é aniversário dela… “Parabéns pra você, nesta data querida…”
Manuella Dantas
Autora da crônica “A Escola”
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6 comentários em “A Escola”
Quantas lembranças demonstradas pela riqueza de detalhes de época! E principalmente, em relação ao cenário das escolas, pois são citadas duas, Lopes Braga (o Grupo) e o Perpétuo Socorro (o Colégio), ambas situadas na praça de São Sebastião. Entretanto, o Colégio era o mais glamoroso mesmo, devido a projeção do olhar dos redentoristas. Os padres foram visionários ao instituir uma arquitetura imponente, provedora de liberdade as gerações e gerações de crianças, adolescentes e também dos adultos, que foram educados e acolhidos nos espaços daquele prédio. Os que estudaram ou que ainda estudam na instituição , conseguem absorver a atmosfera futurística, que até hoje paira no interior da emblemática escola, a Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. É possível perceber os ricos detalhes descritos pelas lembranças afetivas da autora, que, consegue também alcançar a lembrança de milhares e milhares de outros alunos. Sem deixar de citar, é claro, dos nomes de vários educadores como o do professor Barbosa, Bego e Creusa. O apogeu do texto é ler os nomes de alguns ex-alunos, que atualmente, são mestres formados e atuantes pelas universidades do estado. Parabéns pelas lembranças e pelo texto tão bonito! Um presente para todos os ex, e atuais alunos do Colégio.
Grata pela troca de sentimentos que compartilhamos por nossas origens. A verdade é que ir estudar mo Colégio era como se estivéssemos subido de posto. Não que estudar no Lopes Braga não fosse bom, de jeito nenhum, mas o Perpétuo Socorro emanava uma aura majestosa. Aliás, deveria ter falado que o Lopes tinha a melhor sopa de feijão do universo. Repetia quantas vezes a merendeira pudesse encher meu caneco de plástico. Eh saudade…
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A escola Nossa Senhora do Perpétuo Socorro é Maravilhosa, amo demais, mas agora em 10 de dezembro de 2024, a escola deveria ser integral.